Já estamos na quarta onda do café?

Quando se fala do mundo do café, não existe unanimidade na preferência, seja de gosto, seja quanto aos métodos de preparo, seja quanto aos processos, que vão do plantio do grão à bebida na xícara. Com as tendências que movimentam esse enorme mercado, não poderia ser diferente. 

Por isso, a chegada da quarta onda do café, marcada pela democratização e popularização do conhecimento sobre todo o ciclo de preparo e consumo de cafés especiais, divide as opiniões de quem entende do assunto. A diversidade de argumentos faz sentido, mesmo porque nenhuma “onda” ocorre ao mesmo tempo em todos os países e, muito menos, uma exclui a outra.

Em entrevista ao jornal Gazeta do Povo em 2019, a norte-americana Trish Rothgeb, especialista em cafés há mais de três décadas e responsável por cunhar o termo “ondas do café” no início de 2000, acredita que nenhum momento é dominado por uma única tendência. “Os consumidores interagem com café de todas as formas. Em um mesmo dia, podemos beber café de mercado em um encontro, café ruim no posto de gasolina e, à noite, encontrar um amigo para uma experiência cara em uma cafeteria chique. Todos os setores do café estão crescendo”, afirma.

O diretor comercial da Flavors, Paulo Ricardo Lima Alves, concorda com a especialista. “Temos espaço para todos os formatos, tanto para o café na garrafa térmica, presente nos escritórios, e que não vai desaparecer, quanto para o café preparado em uma Hario V60, que se consome logo após o preparo”.

Assim, para que seja considerada como tal, uma “onda” deveria ter suas características muito evidenciadas junto a um amplo espectro de consumidores, o que ainda não estaria ocorrendo, pelo menos em nosso país.

Pioneirismo

Em 2012, a Flavors iniciou no Brasil um movimento pioneiro de difusão dos métodos de café coado. Em parceria com as cafeterias, contribuiu com a chegada da chamada terceira onda da bebida por aqui – aquela que popularizou a experiência do consumo de cafés especiais e suas diversas formas de preparo. 

Antes disso, vivenciamos, a partir da década de 60, o domínio do café espresso e a ampliação do consumo fora de casa, que perdura até os dias de hoje (pré-pandemia), no que foi considerada a segunda onda. A popularização do café preparado no coador de pano ou papel, no âmbito doméstico, como faziam nossos pais e avós seria, então, a primeira onda, verificada a partir da primeira metade do século XX. 

Para Paulo Ricardo, é natural que o surgimento de novas tendências seja contínuo e simultâneo a outras “ondas”, uma vez que a grande versatilidade de usos do café ainda não foi totalmente explorada. “Temos uma infinidade de bebidas preparadas com café, como coquetéis, o próprio café gelado, ou o café frappé, muito popular na Grécia, que o brasileiro não tem o hábito de consumir. O universo de cafés coados atinge 90% da nossa população, mas há muito o que explorar nesse nicho”, explica.

O diretor da Flavors argumenta que a quarta onda do café estará efetivamente consolidada no Brasil quando, por exemplo, se popularizarem os equipamentos que preparam o café filtrado automaticamente, com um apertar de botão, conforme as preferências selecionadas pelo consumidor. “Em outros países, já é costume torrar o café em casa, um indicativo da nova onda, mas isso ainda não ocorre aqui em larga escala. Por outro lado, já é comum moer o café para ser preparado e consumido imediatamente”. 

Segundo o Portal do Agronegócio, a nova geração de cafeicultores tem contribuído com a expansão na quarta onda. “Mais conectados que os pais, os filhos dos produtores tornaram as redes sociais, principalmente o Instagram, uma vitrine para os negócios e buscam estudar mais a fundo as técnicas de torrefação”, afirma o site.

De acordo com o engenheiro agrônomo do Incaper, Fabiano Tristão, as torrefações familiares têm crescido de forma exponencial, impulsionadas pela terceira onda. Atualmente, já são mais de 600 pequenas marcas, somente no Espírito Santo, estado que concentra 60 mil propriedades produtoras de café (sendo 40 mil de conilon e 20 mil de arábica). Desse total, 90% são produtores de café arábica, o preferido dos apreciadores de cafés especiais. 

Independentemente de já estarmos ou não ‘surfando’ na quarta onda do café, é importante estar de olho nesse movimento de democratização dos cafés especiais. “Vale a pena investir nesse mercado”, garante Deiverson Migliatti, fundador da rede de cafés especiais Sterna Café, em entrevista à Rede Food Service. “A tendência é acompanhar o que ocorreu com a cerveja artesanal que, mesmo com valor mais elevado, caiu no gosto do brasileiro. Estamos no caminho de levar o conhecimento do café especial a um maior número de pessoas possível, despertando a curiosidade e refinando o paladar para o café”, conclui.

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